@article{Kjaer_2019, title={DIREITO GLOBAL COMO INTERCONTEXTUALIDADE E INTERLEGALIDADE}, volume={16}, url={https://www.portaldeperiodicos.idp.edu.br/direitopublico/article/view/3456}, abstractNote={<p>Desde os anos 1990, os efeitos da globalização na lei e nos desenvolvimento jurídico têm sido um tópico central no debate acadêmico<a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftn1"><sup><sup>[1]</sup></sup></a>. Até o presente, o debate foi, contudo, marcado por três lacunas que este capítulo tentará remediar a partir de uma reconceptualização do direito global<a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftn2"><sup><sup>[2]</sup></sup></a> como o direito de intercontextualidade marcado pela inter-juridicidade e materializado por meio de um corpo de normas que podem ser caracterizadas por sua conectividade.</p><p> </p><p>A primeira lacuna é de ordem histórica e empírica. Tanto os críticos quanto os defensores da “lei não estatal” compartilham a premissa de que a “lei além do Estado” e as normas jurídicas correlatas teriam ganhado relevância nos tempos atuais se comparadas a períodos históricos anteriores<a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftn3"><sup><sup>[3]</sup></sup></a>. Enquanto o direito global, incluindo tanto o direito público e privado de governança global, bem como as construções regionais, como da União Europeia, passou por profundas transformações desde as estruturais, que seguiram os processos de descolonização em meados do século XX, constata-se que não há mais instrumentos de direito global em comparação com outros tipos de lei no mundo contemporâneo do que havia em outros períodos históricos.</p><p> </p><p>A segunda lacuna é metodológica. A maioria das produções acadêmicas sobre o direito global é ou de natureza analítica, trazendo reflexões a partir do campo da filosofia<a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftn4"><sup><sup>[4]</sup></sup></a>, ou de natureza empírica, observando a existência do direito global e os graus de conformidade<a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftn5"><sup><sup>[5]</sup></sup></a> às normas global em um dado período histórico. Embora essas duas metodologias tenham seu mérito, elas são estáticas, incapazes de explicar e de avaliar a transformação do direito global ao longo do tempo<a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftn6"><sup><sup>[6]</sup></sup></a>.</p><p> </p><p>A terceira lacuna é teórico-conceitual. Em diversas instâncias, o direito global é compreendido como uma lei unitária que produz normas de escala planetária<a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftn7"><sup><sup>[7]</sup></sup></a>, ou, alternativamente, adota-se uma perspectiva pluralista radical que descarta a existência de normas globais singulares<a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftn8"><sup><sup>[8]</sup></sup></a>. No entanto, ambas as abordagens parecem não compreender as características estruturais, função e efeitos societários do direito global. Ao contrário, uma terceira posição entre as perspectivas unitárias e radicais pode ser adotada por meio de uma compreensão do direito global e normas legais relacionadas como um tipo descentralizado de direito intercontextual e caracterizado pela inter juridicidade<a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftn9"><sup><sup>[9]</sup></sup></a>.</p><p> </p><p>O direito global pode ser definido como um fenômeno que, a princípio, é ilimitado em alcance, isto é, detém validade sem referência ou limitação a um território ou população específica, embora, por razões práticas, seja submetido a alguma limitação na maioria dos casos<a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftn10"><sup><sup>[10]</sup></sup></a>. Isso torna o direito global distinto do direito nacional, internacional, transnacional e da lei viva de base comunitária quando definidos da seguinte maneira: direito nacional, a lei dos estados-nação derivada do conceito de soberania; o direito internacional, a lei entre estados-nação; direito transnacional, qualquer lei que, em termos de jurisdição, origem ou efeito, ultrapassa as fronteiras nacionais, produzindo externalidades positivas ou negativas, enquanto continua a depender dos instrumentos e mecanismos legais dos estados<a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftn11"><sup><sup>[11]</sup></sup></a>; lei viva, normas sociais preenchendo a função de lei no seio de uma comunidade<a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftn12"><sup><sup>[12]</sup></sup></a>. Esses quatro tipos de lei podem agir, potencialmente, como fonte do direito global inter-jurídico na medida em que são empregadas numa forma intercontextual.</p><p> </p><p>Refletindo essa estrutura inter-jurídica, o conteúdo normativo substancial do direito global é caracterizado por uma relativa predominância estrutural de normas de conectividade. Normas de conectividade estão orientadas a facilitar o transplante, isso é, a extração, transmissão e incorporação dos componentes de significado de um contexto jurídico-legal para outro, como, por exemplo, no caso do comércio internacional e das leis de investimento, lei comercial doméstica ou leis aprovadas sobre atividades missionárias no contexto das leis religiosas<a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftn13"><sup><sup>[13]</sup></sup></a>. O conceito de normas de conectividade, portanto, diferencia-se do entendimento clássico sobre as normas de coerência<a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftn14"><sup><sup>[14]</sup></sup></a>, cuja finalidade é dar coerência no âmbito de uma coletividade sob a base de prescrições de ações que limitem o escopo de possíveis ações futuras e estabelecer sanções para a não-conformidade<a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftn15"><sup><sup>[15]</sup></sup></a>. Diferencia-se, ainda, de um entendimento progressivo sobre as normas como normas de possibilidade, implicando a articulação de futuros possíveis com base numa distinção entre o factual e o não-factual, isto é, mediante o distanciamento do mundo factual, com o objetivo de acentuar a abertura<a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftn16"><sup><sup>[16]</sup></sup></a> do futuro. Assim sendo, as normas de conectividade são, em outras palavras, um terceiro tipo de normas localizado entre as normas de coerência e as normas de possibilidade.</p><div><br clear="all" /><hr align="left" size="1" width="33%" /><div><p><a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftnref1"><sup><sup>[1]</sup></sup></a> Cf.: SHAPIRO, M. The Globalization of Law. <em>Indiana Journal of Global Legal Studies</em>, vol.1, 1993, p.37.</p></div><div><p><a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftnref2"><sup><sup>[2]</sup></sup></a> NT. No original, global law.</p></div><div><p><a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftnref3"><sup><sup>[3]</sup></sup></a> Quanto aos críticos, cita-se: GRIMM, D. <em>Constitutionalism: Past, Present, and Future. </em>Oxford: Oxford University Press, 2016; LOUGHLIN, M, The Misconceived Search for Global Law. Transnational Legal Theory, n.8, 2017, p.353-359. Entre os defensores estão: BERMAN, P.S. <em>Global Legal Pluralism: A Jurisprudence of Law Beyond Borders</em>. Cambridge: Cambridge University Press, 2012; TEUBNER, G. Global Bukovina: Legal Pluralism in the World Society. In: G. TEUBNER (Ed.), <em>Global Law Without the State. </em>Brookfield: Dartmouth, 1997.</p></div><div><p><a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftnref4"><sup><sup>[4]</sup></sup></a> Cf.: SHAFFER, G.; GINSBURG, T., The Empirical Turn in International Legal Scholarship. American Journal of International Law, vol. 106, issue 1, 2012; TURN, M., Introduction: Law and Compliance a Different Levels. In: YURN, M. e JOERGES, C. (eds.), <em>Law and Governance in Postnational Europe: Compliance Beyond the Nation-State</em>. Cambridge: Cambridge University Press, 2005.</p></div><div><p><a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftnref5"><sup><sup>[5]</sup></sup></a> NT. No original, compliance.</p></div><div><p><a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftnref6"><sup><sup>[6]</sup></sup></a> BRUNKHORST, H., <em>Critical Theory of Legal Revolutions: Evolutionary Perspectives</em>.London: Bloomsbury, 2014.</p></div><div><p><a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftnref7"><sup><sup>[7]</sup></sup></a> Cf.: HABERMAS, J.,<em> </em>The Constitutionalization of International Law and the Legitimation Problems of a Constitution for World Society. <em>Constellations</em>, vol. 15, issue 4, 2008, p. 444-455.</p></div><div><p><a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftnref8"><sup><sup>[8]</sup></sup></a> KRISCH N., <em>Beyond Constitutionalism: the Pluralist Structure of Postnational Law</em>. Oxford: Oxford University Press, 2010.</p></div><div><p><a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftnref9"><sup><sup>[9]</sup></sup></a> AMSTUTZ, M. KARAVAS, V. Weltrecht: Ein Derridasches Monster. In: G-P. Calless, A. Fischer-Lescano, D. Wielsh and P. Zumbansen (eds.).<em> Soziologische Jurisprudenz. Festschrift für Gunther Teubner zum 65. Geburtsta</em>g. Berlin: Walter de Gruyter, 2009, p. 645; DUVE, T., Was ist Multi Normativität? Einführende Bemerkungen. <em>Rechtsgeschichte </em>-<em> Legal History</em>, n. 25, 2017, p. 88-101.</p></div><div><p><a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftnref10"><sup><sup>[10]</sup></sup></a> CASSESE, S. <em>Il diritto globale. Giustizia e democrazia altre lo Stato</em>. Turin: Einaudi, 2009.; FRYDMAN, B., Comment penser le droit global?. In: J-Y. Chérot and B. Frydman (eds.).<em> La Science du droit dans la globalization</em>. Brussels: Bruylant, 2012, p. 21; LHUILIER, G. Le Droit Transnational. Paris: Daloz, 2016; LINDAHL, H.,<em> Fault Lines of Globalization: Legal order and the Politics of A-Legality. </em>Oxford<em>: </em>Oxford University Press, 2013; PALOMBELLA, G. <em>É possibile una legalitá globale? Il Rule of Law e la governance del mondo</em> (Bologna: Il Mulino, 2012); PALOMBELLA, G. Global Law and the Law on the Globe. <em>Italian Journal of Public Law</em>, n. 4, 2012, p.53; WALKER, N., <em>Intimations of Global Law.</em> Cambridge: Cambridge University Press, 2015; XIFARAS, M. The Global Turn in Legal Theory.<em> Canadian Journal of Law and Jurisprudence</em>, n.29, 2016, p.215-219.</p></div><div><p><a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftnref11"><sup><sup>[11]</sup></sup></a> JESSUP, Ph.C. <em>Transnational Law.</em> New Haven CT: Yale University Press, 1956; WALKER, <em>Intimations of Global Law</em>. Cambridge: Cambridge University Press, 2015; CALLIESS, G-P and ZUMBANSEN, P.<em> Rough Consensus and Running Code: A Theory of Transnational Private Law</em>. Oxford: Hart Publishing, 2010.</p></div><div><p><a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftnref12"><sup><sup>[12]</sup></sup></a> COTTERRELL, R. <em>Living law: Studies in Legal and Social Theory</em>. Farnham: Ashgate Publishing, 2008; EHRLICH, E., <em>Grundlegung der Soziologie des Rechts</em>. 4th edn. Berlin: Duncker & Humblot, 1989 [1913].</p></div><div><p><a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftnref13"><sup><sup>[13]</sup></sup></a> Sobre leis comerciais, ver: TRUBEK, D.; COTTRELL, P. Robert Huder and the Theory of International Economic Law: The Law of Global Space in Developing Countries. In: C. Thomas and J. Trachtman (eds.).<em> Developing Countries in the WTO Legal System</em>. Oxford: Oxford University Press, 2009.</p></div><div><p><a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftnref14"><sup><sup>[14]</sup></sup></a> NT. No original, coherency norms.</p></div><div><p><a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftnref15"><sup><sup>[15]</sup></sup></a> Por exemplo, BLAKE, J; KINGSLEY, D. Norms, Values, and Sanctions, in: R. Faris (ed.) <em>Handbook of Modern Sociology</em>. Chicago Il: Rand-McNally, 1964, p.456. MORGENTHAU, H.J. <em>La réalité des normes: En particulier normes du droit international. Fondement d´une théorie des norms</em>. Paris: Félix Alcan, 1934; PARSONS, T. <em>The Structure of Social Action: A Study in Social Theory with Special Reference to a Group of Recent European Writers</em>. New York: Free Press, 1968 [1937].</p></div><div><p><a title="" href="file:///C:/Users/juan.almeida/Downloads/Direito%20Global%20como%20intercontextualidade%20e%20interlegalidade%20-%20final19March2019%20(1).docx#_ftnref16"><sup><sup>[16]</sup></sup></a> NT. No original, openness.</p></div></div>}, number={88}, journal={Direito Público}, author={Kjaer, Poul Fritz}, year={2019}, month={ago.} }