A injustiça reprodutiva como dupla punição: análise foucaultiana da obra “Prisioneiras” em cotejo com dados empíricos do sistema carcerário brasileiro

Autores

  • Ana Carolina Campara Verdum Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito. Departamento de Direito. I Universidade Federal de Santa Maria. (UFSM). Santa Maria (Rio Grande do Sul). Brasil https://orcid.org/0000-0001-9265-4244
  • Eduarda Rodrigues de Almeida Porcino Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Desenvolvimento Social. II Universidade Estadual de Montes Claros. (Unimontes). Montes Claros (Minas Gerais). Brasil https://orcid.org/0009-0009-9529-0437
  • Talita Gonçalves Medeiros Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em História. Departamento de História. II Universidade Estadual de Montes Claros. (Unimontes). Montes Claros (Minas Gerais). Brasil. https://orcid.org/0000-0002-4871-7938

DOI:

https://doi.org/10.11117/rdp.v21i112.7782

Palavras-chave:

Justiça Reprodutiva; Sistema carcerário brasileiro; Mulheres privadas de liberdade.

Resumo

Esta pesquisa investiga como a implementação ou não de direitos sexuais e reprodutivos, além dos correlatos cuidados de saúde, no âmbito do sistema carcerário brasileiro se relaciona com o fortalecimento ou a fragilização do Estado Democrático de Direito. Empregam-se os métodos de revisão da literatura e pesquisa documental, cotejando, por meio de uma análise foucaultiana, o relato de um médico que atuou na Penitenciária Feminina da Capital (Varella, 2017) e os dados do sistema penitenciário brasileiro de 2023 (população, perfil, número de gestantes, lactantes, berçários, creches, filhos em estabelecimentos prisionais, consultas médicas e visitas). Como conclusões, com relação à gestação, amamentação e cuidados com filhos em estabelecimentos prisionais, há violações do direito à parentalidade em ambiente seguro e saudável. O direito à visita íntima não foi plenamente concretizado. A qualidade de consultas médicas internas é fragilizada por carências na estrutura dos estabelecimentos, ameaçando a saúde sexual e reprodutiva. A prevalência de infecção por HIV e sífilis sugere dificuldade na articulação entre justiça reprodutiva, interseccionalidade e doenças sexualmente transmissíveis, bem como desrespeito pelas necessidades únicas das mulheres face a essas doenças. A população carcerária feminina no Brasil em 2023 é formada, em grande parte, por mulheres negras, de baixa escolaridade e presas por crimes da lei de drogas, o que demonstra a seletividade penal e a necessidade de análise interseccional da política criminal e da justiça reprodutiva. Essas conclusões indicam violações à justiça reprodutiva e estas, por conseguinte, sugerem e intensificam a fragilização da democracia e do Estado de Direito.

 

PALAVRAS-CHAVE: Justiça Reprodutiva; Sistema carcerário brasileiro; Mulheres privadas de liberdade.

 

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Biografia do Autor

Ana Carolina Campara Verdum, Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito. Departamento de Direito. I Universidade Federal de Santa Maria. (UFSM). Santa Maria (Rio Grande do Sul). Brasil

Mestranda em Direito na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), com bolsa CAPES. Pesquisadora do NPPDI - Núcleo de Pesquisa e Práticas em Direito Internacional (CNPq/UFSM). Advogada. Pós-graduada Especialista em Direitos Humanos e, também, em Direito Constitucional. Graduada em Direito pela Universidade Federal de Santa Maria.

Eduarda Rodrigues de Almeida Porcino, Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Desenvolvimento Social. II Universidade Estadual de Montes Claros. (Unimontes). Montes Claros (Minas Gerais). Brasil

Mestranda em Desenvolvimento Social na Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes). Pós-graduada Especialista em Direitos Humanos. Advogada. Graduada em Direito pela Unifipmoc. Fundadora do projeto “Filhas de Frida”, agraciado pelo prêmio Neide Castanha de Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes, do Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes (2018).

Talita Gonçalves Medeiros, Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em História. Departamento de História. II Universidade Estadual de Montes Claros. (Unimontes). Montes Claros (Minas Gerais). Brasil.

Pós-Doutoranda do Programa de Pós-graduação em História, da Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES). Bolsista CAPES. Doutora em História pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Mestre em História pela Universidade Federal do Rio Grande (FURG). Graduada em História - Bacharelado - pela Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). Pesquisadora do Laboratório de Estudos de Gênero e História (LEGH - UFSC).

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Publicado

2025-01-31

Como Citar

Verdum, A. C. C., Porcino, E. R. de A. ., & Medeiros, T. . G. (2025). A injustiça reprodutiva como dupla punição: análise foucaultiana da obra “Prisioneiras” em cotejo com dados empíricos do sistema carcerário brasileiro. Direito Público, 21(112). https://doi.org/10.11117/rdp.v21i112.7782

Edição

Seção

Dossiê Temático "Justiça Reprodutiva, Democracia e Estado de Direito"